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​Perguntas e respostas: Como a sociedade civil brasileira está defendendo os direitos à privacidade

Pessoas vistas de cima, próximas a um trem.
​Pessoas em pé na plataforma de uma estação de trem em São Paulo, Brasil, em 18 de março de 2020. ​© Victor Moriyama/NYTimes/Redux

O Supremo Tribunal Federal bloqueou recentemente a implementação de um programa de vigilância que pretendia usar dados de telefones celulares para auxiliar o governo a coordenar a resposta à COVID-19. ​A decisão reconheceu os danos potenciais associados a um programa de vigilância conduzido pelo governo que não fornece salvaguardas adequadas. ​Hannah Draper, da Open Society Foundations, conversou com Bruno Bioni, fundador do Data Privacy Brasil, sobre a decisão.

De que forma o governo brasileiro tentou usar dados coletados dos telefones celulares em seus esforços para combater a COVID-19?

O governo federal e pelo menos 14 dos 27 governos estaduais tentaram coletar dados dos brasileiros para informar sua resposta à COVID-19. ​Muitos estados se uniram a terceiros para coletar essas informações. ​O estado de São Paulo estabeleceu um acordo direito com uma empresa e quatro operadoras de telefonia no Brasil. ​E o governo federal tentou recentemente implementar um programa que permitisse a coleta, o manuseio e o armazenamento de informações sobre 200 milhões de brasileiros.

Por que isso é preocupante?

No Data Privacy Brasil, monitoramos de perto essas iniciativas e recentemente delineamos nossas preocupações em um relatório intitulado Privacidade e Pandemia.

​O principal problema é a falta de transparência. ​Por exemplo, não está claro quais ferramentas de anonimização o governo planeja usar para proteger a identidade das pessoas. ​Esse é um elemento chave em qualquer ferramenta de monitoramento digital. ​No momento, não sabemos se o governo protegerá nossas informações para garantir que elas não sejam roubadas ou compartilhadas com terceiros. ​E o governo não forneceu nenhuma informação sobre como elas serão ou se serão descartadas.

Quais são os riscos associados à essa falta de transparência?

É importante enfatizar que nossos receios aqui não são somente abstratos ou teóricos. ​Muito pelo contrário. ​Por exemplo, a pandemia mostrou como as pessoas podem se tornar vulneráveis se seu estado de saúde se tornar público.

De fato, já existem muitos exemplos em todo o mundo de pessoas sendo expostas à censura pública, hostilizadas ou até mesmo ameaçadas de morte depois de terem sido identificadas nos meios digitais como positivas para COVID-19. Essa é apenas uma das razões pelas quais estamos lidando com essas questões e tentando encontrar uma maneira de garantir que as ferramentas de vigilância do governo não causem danos adicionais aos brasileiros.​ 

Que impacto​ esses casos terão na abordagem do governo brasileiro?

​Conforme declarado pelo Ministro ​Luís Roberto Barroso, essa decisão não impede o governo de usar dados em seus esforços para combater a COVID-19. ​Ao mesmo tempo, a decisão deixa claro que todos os esforços do governo no uso de dados devem incluir as salvaguardas apropriadas. ​Portanto, o governo precisa revisar sua abordagem para cumprir a ordem judicial e garantir que as informações confidenciais dos brasileiros sejam protegidas. 

A lei brasileira de proteção de dados, que entrará em vigor em 2021, capacita os brasileiros a proteger seus direitos a esse respeito?

Sim e não. ​A lei ainda está no período de carência e, portanto, não é aplicável. ​No entanto, existem várias leis e normas – incluindo a Constituição Brasileira – que fortalecem os princípios básicos para garantir a privacidade e os direitos dos brasileiros. 

O que os tribunais disseram sobre os programas do governo?

​O Supremo Tribunal Federal suspendeu recentemente uma medida provisória do presidente que previa o compartilhamento dos dados de mais de 200 milhões de usuários das operadoras de telefonia. Indiscutivelmente, a justificativa da decisão foi tão importante quanto a decisão em si, pois parece sinalizar a disposição de reconhecer a proteção de dados pessoais como um direito fundamental, separado do direito à privacidade.​ 

​Você acha que esse caso pode afetar a maneira como os outros governos fora do Brasil lidam com essas questões?

​Certamente. ​Acreditamos que os olhos do mundo estão voltados para nós. ​Os juízes trabalhando em casos de privacidade e proteção de dados em outros países provavelmente revisarão essa decisão antes de proferir as próprias sentenças. ​E você verá que, mesmo no meio de uma crise política e de saúde pública, a sociedade brasileira conseguiu interromper uma medida que ameaça de fato os direitos fundamentais de mais de 200 milhões de cidadãos.

​Além dos tribunais, esperamos que grupos da sociedade civil com ideias semelhantes se inspirem para questionar as políticas de vigilância de seus governos se eles também não respeitarem esses direitos fundamentais de dados.

Data Privacy Brazil é uma beneficiária da Open Society Foundations.

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